quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O Castelo

A complexidade humana ultrapassa-me, abisma-me e fascina-me.

Há quem viva em castelos, aparente ser o que não é e viva entusiasmado com a ideia de ser um sofredor, como se essa fosse uma verdadeira missão de vida. No entanto, essa característica pode não ter nascido com a pessoa, tendo sido preciso um certo nível de esforço para que pareça fatídico, premonitório e natural. Umas das formas mais comuns é traçar um caminho linear, de acordo com as regras que a sociedade entende serem as melhores, fazer uma lavagem cerebral às próprias opiniões e mergulhar nos inúmeros conflitos interiores e alheios que lhe surgirem ao longo da vida.  Estão previstos alguns efeitos secundários, mas após a habituação tudo começa a fazer sentido.

Lamentos. Infortúnios. Solidão.

Muitas pessoas almejam isso e, lentamente, vão conseguindo. Rendem-se ao isolamento porque se sentem incompreendidas. Vivem por entre os muros do seu belo castelo, impecavelmente mantido ao longo dos anos, para bem de todas as aparências, mas caminham sozinhos por entre quatro paredes diariamente. Mostram a sua apática simpatia, a sua débil generosidade e sua altivez perante os outros, porque, afinal, estamos a falar de seres superiores.

Após um histórico clássico de vida, vai criando conflitos e afastando todos de si. (Esta tarefa crucial requer engenho e imaginação. Para os mais avançados é obrigatório pensar em formas de fazer os outros se sentirem culpados.)

É aqui que começa um vibrante jogo de emoções onde sangue, suor e lágrimas são permitidos. É preciso auscultar o eco que o conflituoso tem em cada pessoa. Tem de medir o seu grau de influência para poder prender a sua vítima e começar o tão aguardado processo de chantagem emocional. Há os que resistem e saem ilesos do campo de batalha e os que se deixam dominar, mas também estes acabam por se libertar.

Aos poucos, o conflituoso vai desgastando os laços que tinha, porque ninguém têm mais paciência para o aturar. No entanto, isso é apenas mais uma razão para inclinar a cabeça, franzir a testa e lamuriar-se como só ele sabe. (É também importante acertar na pessoa que o vai ouvir para conferir mais credibilidade ao discurso e ao consequente passa a palavra). É nestes momentos que a sua vida atinge o auge, o pico de adrenalina. É aqui que pode pegar em diversas histórias que leu em livros, misturá-las com algumas verdades da sua cabeça e mexer cuidadosamente até formar uma consistente mentira. É esta receita que o vai alimentar e nutrir a sua alma cadavérica.

Após anos e anos nesta redoma e clausura, torna-se mestre da manipulação. Consegue criar, esporadicamente e facilmente, alguns atritos com terceiros, afastar algumas pessoas e revolucionar conceitos fundamentais para o ser humano.

Até que fica completamente sozinho, porque não existe mais ninguém que tenha compaixão, interesse, paciência ou dever moral para estar com ele. 

E não existe outro tipo de final possível.

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