quarta-feira, 4 de abril de 2012

Selva

"Na vida só sobrevivem os fortes.
Se és fraco terás de deixar de o ser!"

Autor desconhecido

Continuo a vê-lo. Por mais sombras que atravessem a atmosfera densa, continuo a vê-lo. Nem que ao fundo a tempestade se faça anunciar na sua altivez soberana, ele permanece estático, imóvel, invariavelmente protegido de todas as intempéries que possam surgir até eu o encontrar.
O meu grito atravessa a selva. O meu sangue derrama-se no chão inóspito e vai formando um rasto vermelho cristalino. Os leões aproximam-se. Cercam-me. Abafam-me nos seus rugidos majestosos. Um som rude, seco, que encerra em si o domínio da força e do poder. Vejo os olhos sedentos esperarem o meu vacilo, o meu próximo movimento para me eliminarem. Calculam-me os passos. Preparam a investida. O medo, esse inquilino indesejável, começa a dar de si. Procura um lugar para, levemente, tomar posse de todo um sistema e se personificar em mim. Por mais que a força me abandone, por mais que eu pense que é o fim, eu continuo a vê-lo no topo da montanha. É nele que penso a cada batimento cardíaco oscilante, a cada sorvo de ar que respiro. É nele que me foco para não me desencontrar me perder de mim mesma. É nele que penso neste momento onde tudo parece estar determinado e irremediavelmente terminado.
De súbito, a vida começa a pulsar-me nas veias e a inundar-me de uma vitalidade esquecida, remota dos tantos passados que fui e em que me tornei. Aqui estou eu, fusão de pretéritos, catapultada para o sítio mais hostil e irrespirável, onde o tempo urge e o ar ganha uma consistência desesperada.
Lembro-me do primeiro passo que dei num troço invisível e sem rota calculável. Uma viagem sem regresso. Uma caminhada no inesperado. Um cruzamento de hipóteses. Estou aqui. Estou aqui perante uma plateia que anseia o meu fraquejo, a minha queda, o meu infortúnio. O público que me cerca teme concorrência e impõe-se pela força, porque não reúne outro apetrecho viável. Apetece-me chorar, desistir, voltar. Apetece-me o impossível. Apetece-me esquecer toda a história que construí e apagar todas as memórias e desconstruir esta realidade. Mas tu permaneces lá, imóvel, estático, inabalável, inquebrável. É inacreditável como não desististe de mim, mesmo quando eu me questiono se tenho forças para te tocar. É inacreditável como te tornas cada vez mais sólido e urgente a cada passo dado e te tornas crucial para o meu enigma.
Os leões cercam-me, atiçam-me mas a sua força é irremediavelmente fraca quando comparada à força dos meus ideais. Posso perder a batalha, posso sangrar, mas não desisto.
O meu olhar permanece pousado tranquilamente na meta.
No meio do nada prometi alcançar-te. Espera-me. Estou a caminho.

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