quarta-feira, 13 de julho de 2011

Chão

Caminho num mundo almofadado de tecidos gastos. É um espaço em iminente ruptura. É um chão que se vai abrir a qualquer momento, revelando o abismo que me cerca.
Vou acautelando os passos, vou atentando os meus movimentos. Do céu transpiram finas gotas de chuva, que aumentam o risco de quem, cá em baixo, se move por entre as ruas.
Sinto a ameaça apoderar-se de mim, fazendo da minha pulsação uma maratona. Envolvo-me em medo. Embrulho-me em silêncio. Tenho medo. Tenho medo do que pode acontecer. Tenho medo de perder o chão.
Olho à minha volta e sou incapaz de conter o impulso de me revoltar contra tudo e contra todos, contra a injustiça do que está a acontecer. Revoltar-me contra mim própria, porque não tenho controlo sobre nada.
Tentando refugiar o medo, percorro todos os meus lugares, até que encontro o eco que procurava. É nesse lugar onde a verdade emite uma ressonância incomparável que todos os meus sentidos se libertam, esquecendo tudo o que está a acontecer, calando todas as vozes das pessoas que passam por mim sem se aperceberem do que se está a passar e de todas aquelas que se acercam de mim, tentando assistir à minha prestes inexistência.
Respiro o ar húmido sofregamente, sentindo os pulmões em sofrimento. Choro lágrimas que pensava que não tinha. Agarro-me aos firmamentos que existem dentro de mim.
Vendo-me murchar, asseveram-me críticas, acelerando o processo que se adivinha quase concluído, como se eu me estivesse a dar por vencida.
Até que, inesperadamente, do céu cravado de nuvens, surge uma luz, primeiro ténue, que progressivamente ganha força até se mostrar toda a sua exuberância, que quase me cega.
O chão começa a sossegar.
Os vultos dos abutres afastam-se.
Invadida por forças que não julgava que me habitassem, levanto-me e assento firmemente os pés, que outrora cambaleavam num solo instável.
Os meus olhos são atravessados pelas cores do arco-íris, que parece ter sido pintado à mão. Cá dentro, o coração descansa, a verdade impera.
Olhando à volta, parece que nada se alterou, que o mundo não esteve para acabar. Parece que o este chão agora retalhado não esteve prestes a deixar de ser matéria e que eu não estive prestes a entregar-me nos braços do desconhecido.
Fechando os olhos, inspiro, como se há muito não inspirasse, sentido a rota percorrida pelo oxigénio até aos meus pulmões.
Fui salva pela consciência, esse lugar etéreo onde navego tranquilamente, onde a minha verdade reina. A verdade apenas reconhece na verdade. Apenas se abala com a verdade.
A verdade. Simplesmente. 

2 comentários:

  1. adorei

    "Até que, inesperadamente, do céu cravado de nuvens, surge uma luz, primeiro ténue, que progressivamente ganha força até se mostrar toda a sua exuberância, que quase me cega.
    "

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  2. "A verdade apenas se reconhece na verdade. Apenas se abala com a verdade."

    keep walking...Don't look back

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