segunda-feira, 11 de julho de 2011

Estrada


«Nem todos os caminhos são para todos os caminhantes.»
Goethe



As pernas tremem, mas avanço sem pensar duas vezes e sem olhar para trás.
Pelo meio dos meus passos, os meus pensamentos correm intensamente, divagando sobre que futuro me espera aqui. 
Estou onde devo estar. Disso tenho a certeza. Todos os pequenos desvios me trouxeram aqui, são pedaços de uma terra dilacerada que já não existe.
Lutei. Cai. Levantei-me. Continuei.
Chorei. Sangrei. Aprendi. Cicatrizei.
Tudo o que aconteceu, aconteceu por uma razão. O que não aconteceu também não foi em vão.
O tudo constrói-se do nada, do tempo que passou e que será. A vida arquitecta-se, desmonta-se. Os pedaços que ficam reorganizam-se e voltam a ser um todo, um ser, uma vida.
Às vezes é preciso o caos para gerar a ordem.
Às vezes o que queremos não é o melhor para nós.
Às vezes não podemos ser donos da mão que maneja o destino.
Às vezes é preciso perder o controlo e deixar-se ir até onde a vida nos levar.
Não tenho medo de perder. Nada me pode tirar o chão em que piso e deixar-me num abismo. Não tenho medo. Calejei os sentimentos e cravei na pele a força necessária para enfrentar o desafio. Muni-me de uma sólida armadura que me sustenta como se fosse o meu cerne, o meu alicerce, a minha base. Matéria indestrutível, inquebrável, inabalável.
Rasguei as redes que me prendiam, corri por um caminho que desconhecia e aventurei-me na escuridão, deixando todas as luzes laterais apagarem-se. O amanhã acontece às escuras. Sempre. Por isso aprendi a velar a escuridão.
Deixei de ser radar desnorteado, mapa sem coordenadas. Aceitei não ser ponto de chegada, nem ponto de partida. Interiorizei que não tenho começo nem término. Sou um fotograma lento de tempo remoto. Cessei as guerras de antíteses.
Aceitei as incertezas e agarrei-as como toda a força que possuo, pois são elas as pistas para as convicções.
Mas o que seria se tudo fosse absoluto e não relativo?
Não importa o ‘como’ nem o ‘quando’. Importa chegar.


Transportada de novo para o meu novo cenário, vejo os meus passos mecânicos, automáticos, chegarem velozmente ao seu destino.
A distância encurta-se e a mente esvazia-se, dissipando alguns resquícios de pensamentos turvos.
A realidade mostra-se numa porta, que abro sem hesitar.
Cheguei.


2011/07/11

1 comentário:

  1. é caso para dizer: podes não ter o caminho que querias, podes não ser o puzzle completo, as peças perfeitas, o lugar fora do lugar, em meios de tempo, num tempo espacial, que coordenas mecanicamente. Podes não caminhar naquele caminho. Porque este é o teu. Pode ser torto, ter pedras de um passado, obstáculos no presente, podes ser a terra esbatida no meio do nada, o vento que sopra só aqui, o estremecer, a chuva que se dissolve em sol. Por de trás pode não estar o dito arco-íris. Mas esta és tu. Caminhante do teu próprio caminho, por entre o tudo e o nada. Porque todas as peças terão de ser refeitas. Constrois novas vidas, num coração que nunca saiu do lugar a que pertence.

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